É só chegar e começar a falar. Mais falar sobre o quê? O que
ela quer saber? Quarenta minutos é muito pouco pra contar a minha vida
inteira. Quarenta minutos é muito pouco para contar, se quer, os últimos cinco
anos da minha vida. Talvez seja um bom caminho começar tentando explicar por
que eu vim até aqui e por que eu passei esse tempo todo protelando essa
consulta. Passei anos inventando desculpas. Todas pra mim mesma, pra mais
ninguém. Faltava tempo. Primeiro o colégio, depois o vestibular, a faculdade, o
estágio e em breve seria a monografia. Desculpas, desculpas. A verdade é que,
na minha cabeça, pagar para alguém me ouvir falando da minha vida não fazia
sentido. Eu tenho amigos, não sou uma pessoa antissocial. E eu os alugo bastante,
diga-se de passagem. Na pior das hipóteses eu poderia marcar uma hora na frente
do espelho e resolver meu problema (ok, aí sim eu teria um bom motivo para me
consultar). Eu não desmereço o trabalho
do psicólogo, longe de mim. Quem tem casos de depressão e esquizofrenia na
família sabe bem o valor que tem esse profissional. Só não achava que um dia,
eu precisaria dele para colocar minhas ideias no lugar. Pra mim, o grande trunfo do
psicólogo é a imparcialidade. A mesma que os jornalistas deveriam ter quando
produzem suas matérias tendenciosas e colocam a ideia pronta na cabeça do
telespectador. O psicólogo não conhece você, não é apaixonado por você, não
morou com você e não faz parte da sua vida, a não ser durante os quarenta
minutos dentro daquela salinha. Com ele, você vai colocar os pensamentos na
mesa e ele vai ajudar a organizá-los, simples assim. Tudo bem, não tão simples
assim. Entre Jung e Freud, há muito mais do que minha mente de publicitária
poderia entender no momento. O fato é que, com as técnicas, teorias e
imparcialidade, ele [o psicólogo] consegue fazer com que entendamos o que se
passa na nossa cabeça e descomplica esse mundo que tantas vezes parece um
grande embaralhado de ideias e problemas.
E na minha primeira experiência de auto-conhecimento-insano-psicológico,
a conclusão foi: eu não preciso largar uma oportunidade definitivamente para
aproveitar as outras que estão passando por mim. A vida não é tão exata assim.
Eu era quem menos deveria pensar desse jeito. Nada é definitivo, nem minhas
opiniões, quem dirá os próximos três anos da minha vida. É, e eu precisei de
quarenta minutos e um ouvinte imparcial para chegar até aí. Palmas para mim!
Ironias à parte, tem sido bastante proveitoso. Quem sabe na próxima sessão eu
descubra algum sentimento ou desejo guardado no obscuro do meu subconsciente
que se manifesta nos meus sonhos sem eu saber.
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