terça-feira, 26 de abril de 2011

Dois slides.

      Olhei o celular pela décima segunda vez. Dois minutos passaram e nenhuma nova mensagem. É que a luz do projetor me faz lembrar a meia-luz que fica no nosso quarto com a luminária ligada. Aquela fresta que me deixa ver somente tua silhueta desenhada na penumbra. E toda essa discussão sobre arte me dá vontade de ir pra casa te encontrar e virar a noite ouvindo teus discursos. De ouvir tua boca citando Chico, brigando comigo por nunca discordar de nada e nunca entender a minha hipnose causada pela tua voz. É que até teu silencio é contemplativo. Eles aqui falando de cinema e eu querendo você e a TV ligada pra ninguém. Nem o Jô, nem o episódio mais hilário de Friends. Pra quê gastar nossas madrugadas com qualquer outra coisa que não você, se meu dia foi contando cada passo focado na travessia da porta do nosso apartamento? Mais dois slides, a tua mensagem no celular “Chega logo!” e eu já até me sinto aí.

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Bola de mentiras montanha abaixo.

    É que mentir é tão mais fácil. A culpa da mentira é menor que aquela da verdade dita sem pudor. Menor do que o peso do sofrimento alheio pelas palavras proferidas por nossas bocas, mesmo que verdadeiras. “Sou eu, não é você” sai mais naturalmente que “eu não te amo mais”. Poupam-se lágrimas, desgastes e discussões prolongadas e doloridas. A mentira é involuntária e conveniente, e passamos a dizê-las como um dependente químico que toma sempre “o último copo”. Só mais essa. E outra. E mais outra. Uma mentira engata na seguinte e a grande bola de neve nos engole. Somos nós nessa grande bola de mentiras rolando montanha abaixo. Cheia de “bom-dias”, “como você está bonita” e “Te ligo amanhã”.
     A mentira passa a ser um requisito social. Mentimos pela necessidade de uma convivência social saudável e relativamente estável. E de tão necessária acabamos acreditando inclusive nas mais desavergonhadas. De tão comum passa a ser verdade. Em um ponto a mentira deixa de ser verdade, ou é a verdade que tem um quê de mentira, ou a mentira que já não é mais mentira. E tudo se confunde. Amor, amizade, carinho, desprezo, indiferença, orgulho, inveja, felicidade, depressão. Vivemos uma verdade sozinha entre quatro paredes e outra, também verdade, ou meio mentira, no mundo fora do nosso. E o que é verdade? Ou mentira?

sábado, 2 de abril de 2011

Perdão

     Que me perdoem os desenhos esquecidos de canto, os versos pela metade. Que me perdoem os amigos pelo ouvir distraído. Os ex-namorados e até mesmo os futuros. As mensagens não respondidas e recados ignorados. Que me perdoem a irmã, a mãe, o pai e a vó. Perdoem as chamadas não retornadas e a toalha jogada na cama. O aniversário que passou e a visita que não fiz.  O conselho que não dei e o presente que esqueci.
     Tudo e todos que me perdoem, mas esse tempo era meu. Precisei me fechar e esquecer o tudo por um enquanto para que não virasse um para sempre. Para que eu fosse o centro, o egoísmo e a individualidade pura por um dia, uma semana ou um mês, se fosse o caso. Olhar para dentro e limpar os vidros pra que a vista da janela ficasse mais clara e fizesse mais sentido. Perceber que, às vezes, olhar pra trás é fundamental na hora de traçar um caminho adiante.
    Perdão.