Chegou cedo e puxou a cadeira junto com os dois amigos. Bastou um sinal e o “parceiro” trouxe a primeira da rodada. Afrouxou a gravata antes do primeiro gole, que desceu lavando todos os desaforos que engolira aquela semana. Ainda não era sexta-feira, mas a quinta já sugeria pelo menos duas garrafas e alguns desabafos. Era regra de Happy Hour não falar de trabalho, mas ficava meio difícil não soltar um ou outro comentário malicioso, já que sobre o que ele mais queria conversar, tinha vergonha. Não precisou nem falar, bastou pensar e ela atravessou a rua em direção à mesa com outras duas amigas. Observou cada detalhe, o blaser nas mãos, o coque no cabelo escovado e o rosto discretamente maquiado. De manhã ela estara impecável. E mesmo no fim do expediente, já relaxada, continuava linda. Eram de departamentos diferentes. Um dos poucos momentos em que se cruzavam era no começo do dia, ele já sentado na sua mesa, observava as 8h13 da manhã. Pontualmente.
Cada dia, uma fala diferente ensaiada. Nunca coragem o suficiente. Sabia da sua rigidez, ouvia sua fala firme e colhia comentários no café sobre sua competência. Queria descobrir mais. Tentava imaginar que músicas ouvia na hora do banho, e se dançava na frente do espelho quando ninguém estivesse olhando. Perguntava-se se choraria ou balançaria no salto quando ele a tomasse nos braços e dissesse tudo que sentia. Mas era tão distante dele, tão maior, tão perfeita. E agora ela estava ali. Eram todos iguais, tentando compensar na cerveja a dureza de uma semana puxada. Ela passou e não olhou. E nem podia. Como reconheceria alguém que se escondia por detrás do computador cada vez que ela se aproximava. Respirou fundo e tentou buscar coragem nos poucos goles de álcool no seu corpo. Levantou, parou, olhou. Seus amigos perguntaram “Algum problema?”. Ele respondeu “Não, só os mesmo de sempre. Do trabalho.” Bebeu outro gole de medo e sentou ao lado da desilusão.